Por Danielle Farias

Abril está chegando, e com ele, as mobilizações pelo Dia Mundial de Conscientização do Autismo, celebrado em 2 de abril. Em Tailândia, já começaram as postagens e eventos, me deparei com esse título “o fantástico mundo do autismo”. Mas é justamente aí que mora a reflexão mais urgente: o autismo não pertence a um mundo fantástico, separado da realidade. Não existe um universo à parte onde as coisas são surreais. O autismo é real. Ele é vivido todos os dias por famílias inteiras — com amor, sim, mas também com muitas dificuldades e falta de apoio.

Quem vive o autismo na pele sabe que a maior barreira ainda é o descaso.

A realidade é dura. Faltam políticas públicas eficazes, faltam profissionais capacitados, faltam tratamentos adequados. Faltam direitos que, no papel, até existem — mas que na prática estão longe de serem acessíveis.

O laudo médico, por exemplo, essencial para garantir o acesso a direitos básicos como o BPC (Benefício de Prestação Continuada) chega a demorar mais de dois anos para ser emitido pelo sistema público. Enquanto isso, as famílias enfrentam uma verdadeira peregrinação por atendimento. E mesmo quando conseguem o diagnóstico, o tratamento oferecido pelo SUS em Tailândia por exemplo é fragmentado, com sessões espaçadas de três em três meses, o que é insuficiente para qualquer avanço real.

O autismo exige tratamento multidisciplinar, com fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional, psicólogo, fisioterapeuta e acompanhamento pedagógico — profissionais que muitas vezes estão em falta nos municípios, principalmente no interior do Brasil.

E na escola? Onde está a inclusão prometida?

A inclusão escolar ainda está longe de ser efetiva. Crianças com autismo continuam sendo deixadas de fora por falta de cuidadores ou por despreparo das instituições. Professores não são capacitados, muitas escolas não aceitam a matrícula, e quando aceitam, não oferecem o suporte necessário. Isso sem falar nas famílias que recebem a “sugestão” de deixar a criança em casa — como se estudar fosse um privilégio e não um direito.

E as mães solo? Cadê o apoio psicológico?

Grande parte das cuidadoras dessas crianças são mães solo. Mulheres que abriram mão da vida profissional para se dedicar aos filhos, enfrentando diariamente a sobrecarga emocional e a ausência de suporte. E mesmo diante desse esforço incansável, não têm acesso a acompanhamento psicológico, nem recebem apoio real das políticas públicas. São heroínas silenciadas, que resistem mesmo quando tudo ao redor parece falhar.

O Instituto Acreditar nasceu para preencher parte dessa lacuna.

Em Tailândia, o Instituto Acreditar surgiu com o propósito de acolher essas famílias e oferecer o mínimo de suporte que deveria vir do poder público. Com amor, dedicação e muito esforço, o Instituto oferece atendimentos, oficinas, orientação e luta diariamente para dar voz a quem muitas vezes é ignorado. Mas é preciso lembrar: o Instituto é apenas uma ponte, não pode substituir o papel do Estado., nem do Município

Nós precisamos de muito mais do que comemorações no dia 2 de abril. Precisamos de ações concretas, de políticas públicas efetivas, de planejamento, de empatia. Precisamos que amplie a emissão das carteiras do autista, que o município promova mutirões para diagnósticos, que haja investimento em capacitação e contratação de profissionais. Precisamos de dados atualizados, visibilidade e respeito.

Porque o autismo não é comemorado uma vez por ano. Ele é vivido todos os dias.

Famílias convivem diariamente com as barreiras da sociedade, com a exclusão, com a burocracia, com o silêncio. O que se espera não é caridade, é justiça. É o cumprimento daquilo que já está na lei, mas que não chega à prática.

O autismo não pertence a outro mundo. O autismo é deste mundo.

E precisa ser visto, respeitado e incluído — todos os dias.